As histórias de Santa Teresa começam poucos anos após a fundação da cidade, em 1565. No início do século XVII, já era lugar da manifestação da religiosidade e das festividades populares que ocorriam no entorno da Capela de Nossa Senhora do Desterro, cuja imagem, tida como milagrosa e responsável por muitas curas, atraía devotos, romeiros e peregrinos.
A ermida se localizava onde fica, hoje, a Ladeira de Santa Teresa, e foi fundada nos anos 1620 pelo português Antônio Gomes do Desterro, que mantinha uma quinta na colina batizada de Morro do Desterro, por causa do nome dele e da capela. Já nessa época, há registros de escravos negros fugidos que se escondiam nas matas do Desterro
Está capelinha e pequeno santuário, situada então em um Morro agradável, naquela época com belas vistas para Cidade e Baía de Guanabara, passou a atrair inúmeros moradores do Rio de Janeiro de então, não somente pela devoção com a Santa, mas por ser o local aprazível e ótimo para passear.
A Capela e Santuário de Nossa Senhora do Desterro, ficava à uma distância de 3 km da então Cidade do Rio de Janeiro. A capela ficava também perto da Igreja de Nossa Senhora da Ajuda, que ficava na área hoje conhecida como Cinelândia ou Praça Marechal Floriano.
Embora estivesse à apenas 3 km da Igreja da Ajuda, nesta época era necessário contornar a lagoa do Boqueirão existiu até o final do século 18, quando então foi aterrada. No local desta lagoa, foi construído o Parque Passeio Público.
Em função da grande devoção que tinha por Nossa Senhora do Desterro, Antônio Gomes do Desterro decidiu doar suas terras que tinha no local onde ergueu a capela. Doou não apenas as terras dos arredores da capela, mas também outras fazendas, para que fornecessem rendimentos para amparar para sempre as obras e a casa da Santa de sua devoção.
Em 1710, o caminho, que começava em Mata-Cavalos (atual Rua do Riachuelo) até a ermida, foi um dos mais importantes palcos da resistência dos portugueses durante a segunda invasão francesa à cidade. Um combate foi travado aos pés do Morro de Santa Teresa. O combate se deu entre as tropas do corsário francês Duclerc, que com mais de mil homens havia desembarcado em Guaratiba, subido e descido o caminho da Estrada dos Três Rios, que passa pela serra que separa a baixada de Jacarepaguá da área da atual Tijuca e cercanias, e vindo passar pela Estrada de Matacavalos, atual Rua Riachuelo.
Foi no local que encontraram tropas improvisadas, com cerca de duzentos homens à paisana e mal armados, que ofereceram combate. Em decorrência do fato e do combate, a ermida sofreu um início de incêndio. Embora tivesse existido a resistência no local, Duclerc conseguiu passar, mas foi finalmente derrotado em combate travado na Rua Direita, atual Rua Primeiro de Março no centro do Rio.
Era também em Mata-Cavalos que morava a família de Jacinta Pereira Alves, nascida em 1715, no dia do bicentenário da santa espanhola Teresa d’Ávila, fundadora da Ordem das Carmelitas Descalças. Querendo, tal como a santa, uma vida de orações, martírios e retiro, ela se encerrou, junto com a irmã, numa chácara abandonada no Morro do Desterro, a Chácara da Bica, cujo ponto mais alto ela batizou de Chácara do Céu.
As virtudes religiosas das irmãs se espalharam pela cidade. Quando, em 1742, elas ergueram uma modesta capela consagrada ao Menino Jesus, a Chácara da Bica praticamente virou um convento informal que atraía outras jovens religiosas, já que, na cidade, não havia nenhum convento oficial da Igreja para mulheres. Lá, na Chácara da Bica, elas viviam sob as rígidas regras monásticas das carmelitas, mesmo sem se professarem canonicamente.
O fato atraiu a atenção do capitão-general da cidade do Rio de Janeiro e das Minas Gerais, o conde de Bobadela e vice-rei do Brasil, Gomes Freire de Andrade, que, na época, fazia a construção do Aqueduto da Carioca. Incentivado pelo então bispo da cidade, dom frei João da Cruz, da ordem dos Carmelitas Descalços, ele mandou construir para elas um convento, na altura de onde ficava a ermida dedicada à Nossa Senhora do Desterro, que, naquele mesmo ano, ganhou uma igreja na Lapa. Com a construção, a irmandade, que já tinha a posse das terras da Chácara da Bica, recebeu também as terras da antiga Chácara do Desterro e da Chácara das Mangueiras. O Convento de Santa Teresa seria o primeiro convento feminino.
Quando a obra ficou pronta, em 1751, o bispo já era outro: dom frei Antônio do Desterro, da Ordem dos Franciscanos, que não permitiu que o convento fosse dedicado à Santa Teresa, mas, sim, à Santa Clara. Iniciou-se um imbróglio entre o bispo e Jacinta Pereira Alves, que se recusou a ser irmã clarissa. Ela morreu em 1768 sem se professar, pois nem ela nem o bispo voltaram atrás em suas decisões. A questão do convento só seria resolvida em 1781, oito anos após a morte de frei Antônio, quando, enfim, o convento foi canonicamente professado às carmelitas. E, assim, o Morro do Desterro virou, finalmente, o Morro de Santa Teresa. A ordem é contemplativa e ascética e suas religiosas vivem até hoje isoladas do mundo exterior, ou seja, enclausuradas. Tais princípios definiram o espaço arquitetônico do convento e da igreja, que preservam o isolamento das irmãs, inclusive nas missas, das quais elas participam atrás de grades.
Até fins do século XVIII, o morro de Santa Teresa era basicamente uma grande área rural dividida em várias quintas de produção de cana-de-açúcar, café e produtos de subsistência. Além disso, junto com a vocação religiosa, o morro servia para atender as necessidades de abastecimento de água da cidade de aterros e charcos. O crescimento do bairro acompanhava as construções de chácaras que subiam as encostas beirando os encanamentos que traziam água para abastecer o Chafariz da Carioca, no centro da cidade. O caminho do aqueduto hoje é conhecido como Rua Almirante Alexandrino, a principal via do bairro.
Até então, a vida pacata do lugar só era quebrada pelos protestos dos negros quilombolas que, quando enfurecidos, costumavam entupir com lixo a tubulação do aqueduto que levava a água do Rio Carioca para a parte baixa da cidade. Nessa época, porém, com o Rio de Janeiro já elevado à condição de capital da colônia, começou a haver um lento processo de fracionamento das terras das velhas quintas e chácaras de Santa Teresa.
Quando a família real chega ao Rio de Janeiro, em 1808, o então pacato morro se agita. O Convento das Carmelitas vira lugar privilegiado da manifestação religiosa da corte portuguesa e refúgio predileto da mãe de dom João VI, dona Maria, que lá passa longos períodos de reclusão
A época, a irmandade do convento já havia iniciado o fracionamento de suas terras, processo que foi acelerado com o aumento dos impostos após a declaração de independência do país. Um dos terrenos por elas fracionado, na Chácara do Céu, foi comprado em 1837 por Irineu Evangelista de Souza, o futuro barão de Mauá.
Por volta dos anos 1850, o loteamento das antigas chácaras se acelerou, e Santa Teresa começou a abrigar várias famílias abastadas (inclusive de nobres) e imigrantes (principalmente ingleses e franceses), que encontravam no morro refúgio contra a febre amarela e várias outras doenças que começaram a assolar a insalubre parte baixa da cidade. Como essas enfermidades praticamente não chegavam ao morro, Santa Teresa virou, na época, uma espécie de metáfora da saúde e de um estilo de vida mais contemplativo. Seus mirantes naturais viraram ponto de onde vários artistas europeus passaram a registrar as paisagens do Rio oitocentista. Surgem vários casarões inspirados na arquitetura francesa da época, conhecidos como sobrados. Ainda no século XIX, com o remodelamento da cidade do Rio de Janeiro, novas tecnologias são introduzidas para a modernização como, por exemplo, transporte, iluminação, abastecimento de água. Os novos moradores do bairro constroem suas casas nesse padrão moderno, tornando a arquitetura de Santa Teresa variada e eclética. O morro virou bairro e lar de inúmeros artistas e intelectuais. Pixinguinha, Carmem Miranda, Bibi Ferreira e Procópio Ferreira foram apenas alguns dos personagens ilustres que aqui moraram.
Durante o século XX, Santa Teresa assistiu de cima todo o processo de desenvolvimento maciço do centro da cidade do Rio de Janeiro. Nessa época, o Rio de Janeiro é marcado pelas obras de reformulação urbana de Pereira Passos e conta com a migração de parte da população desalojada pela derrubada do Morro do Castelo que subiram a ladeira à procura de baixos aluguéis. Esta pode ter sido a razão de muitos artistas procurarem o bairro como local de residência. Imigrantes, principalmente portugueses e italianos, também se interessam pelas áreas mais desvalorizadas. Artistas, fascinados com a vista da cidade e da baía, encontram no bairro um ponto privilegiado para criar suas artes. Durante a Segunda Guerra, artista e intelectuais, fugindo da Europa encontram ali seu refúgio. Tais artistas passam a se reunir criando um ambiente intelectual comparado com os bairros boêmios da Paris do entre guerras. Com o fim da guerra o grupo se dispersa, mas Santa Teresa continua sendo território artístico respeitado da cidade.
A ocupação desordenada do bairro, causada pelo crescimento da cidade e a especulação imobiliária de vários bairros tradicionais, gera problemas e confrontos dentro do bairro. Em 1982, o projeto de lei do vereador Sérgio Cabral, transforma o bairro em Área de Proteção Ambiental – APA, que mais tarde se tornaria Área de Proteção do Ambiente Cultural – APAC. Nos dias atuais, a violência que se espalhou pelo Rio de Janeiro atinge também o bairro. Antigos moradores não residem mais e outros procuram formas de viver com segurança. Várias partes de Santa Teresa estão ocupadas por favelas. Cientes da condição do local, grupos comunitários trabalham com todos os moradores, inclusive os de comunidades, para manter as características que por muitos anos diferenciaram o bairro dos demais.
REFERÊNCIAS
Silva, Telma Mendes da; Vilela, Elizabeth ; Dias,Rodrigo Ferreira; Silva, Pamela de Figueiredo Curvelo; Leibão, Priscila de Carvalho. ASPECTOS MORFOLÓGICOS DO BAIRRO DE SANTA TERESA (RJ) – IMPORTÂNCIA E CONSERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO NATURAL VIII Simpósio Nacional de Geomorfologia I Encontro Íbero-Americano de Geomorfologia III Encontro Latino Americano de Geomorfologia I Encontro Íbero-Americano do Quaternário
Xavier, Rachel da Costa. TURISMO, IDENTIDADE LOCAL E PARTICIPAÇÃO SOCIAL: O CHARME DE SANTA TERESA. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Turismo da Universidade Federal Fluminense, como requisito final para a obtenção do grau de Bacharel em Turismo. NITERÓI 2008
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