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ENTRUDO - O CARNAVAL DAS ANTIGAS

Foto do escritor: danielericcodanielericco


O entrudo, brincadeira praticada no período do carnaval, foi trazido para o Brasil por colonos portugueses no alvorecer do século XVII. Apesar de sua grande popularidade, a celebração permaneceu desde o momento em que foi introduzida no Brasil até o início do século XX, período que marcaria a como uma festividade “fora da lei”. Em Portugal, assim como no Brasil, o entrudo era bastante difundido e praticado entre a população.

O entrudo foi até meados do século XIX a principal e mais difundida manifestação carnavalesca no Rio de Janeiro. Somente após o surgimento das Grandes Sociedades Carnavalescas, em 1855, e com apoio de campanha negativa feita por jornalistas, médicos, higienistas, entre outros segmentos profissionais, a expressão “entrudo” passaria a designar um jogo de molhadelas proibido e em oposição ao carnaval.

“... costume de molhar-se e sujar-se uns aos outros com limões ou laranjinhas de cera recheados com água perfumada, com recurso a seringas, gamelas, bisnagas e até banheiras — e todo e qualquer recipiente que pudesse comportar água a ser arremessada. Incluía também, em determinadas situações, o uso de polvilho, ‘vermelhão’, tintas, farinhas, ovos e mesmo lama, piche e líquidos fétidos, entre os quais urina ou ‘águas servidas’.”

O entrudo era uma oportunidade de se pregar peças a conhecidos ou passantes, ocasião de fazer pilhérias com o fim de ridicularizar o outro, ações que fora daquele dado contexto podiam implicar em atritos e problemas.

Uma característica importante do jogo das molhadelas é sua difusão por todo o território e por todas as classes sociais, tendo sido praticado por atores sociais diversos, desde os escravos até a família imperial. Havia uma diferenciação clara entre o entrudo familiar, praticado pelas famílias abastadas da Corte, e o praticado pela população pobre do Rio de Janeiro. Tal diferença se dava em diversos níveis: o material utilizado no jogo por cada classe social, por exemplo, não era o mesmo. A elite utilizava limões-de-cheiro e bisnagas, enquanto a plebe, que não tinha condições de produzir em casa seu arsenal, munia-se dos artefatos mais baratos e mais acessíveis, utilizando tipos diferentes de líquidos: água suja, café, groselha, tinta, lama e até urina. O espaço de cada um desses segmentos para realizar a sua brincadeira também não era o mesmo. Os escravos tinham participação no jogo das elites, servindo de apoio à brincadeira, provendo seus senhores do material necessário para o jogo. Assim a Corte praticava um entrudo doméstico, familiar, no interior de suas residências com familiares e conhecidos ou das sacadas e janelas com desconhecidos. Na rua, o entrudo era praticado por homens, conhecidos ou não. A população pobre e os escravos também ocupavam as ruas do Rio de Janeiro como espaço próprio de exercício do jogo. Era uma ocasião que ia além da folga e do divertimento, como forma de inverter o jogo e rir dos brancos.




A presença e a predileção feminina por esta manifestação carnavalesca é uma das razões que ajudam a explicar a longevidade do entrudo. Muitos relacionamentos amorosos e casamentos foram iniciados durante o entrudo.

A fabricação caseira de todo o arsenal utilizado no entrudo funcionava ainda como uma possibilidade de renda extra para as famílias mais pobres, que vendiam seus produtos pelas ruas da cidade. Também casas especializadas na venda de artigos para o carnaval lucravam com o jogo. Os comerciantes ofereciam a cada ano novos materiais relativos ao entrudo, o que serviu para que a brincadeira perdurasse por tanto tempo, apesar das proibições. As casas comerciais regulares chegaram a ser vítimas diretas da ação policial, que por vezes chegou a invadir estabelecimentos e apreender produtos relacionados à brincadeira.

Ao longo do século XIX, o entrudo ganhou ainda outra característica interessante: sua vinculação à imagem da monarquia. Tal fato se dava pelo conhecido gosto da família imperial por sua prática, sendo comuns os festejos tanto em Petrópolis quanto no Paço Imperial

Apesar de toda a sua popularidade, o entrudo foi considerado como uma prática ilegal. A despeito de todas as iniciativas estatais de repressão e controle, a brincadeira se manteve durante o período colonial, estendeu-se por todo o Império e ainda pôde ser verificada nas primeiras décadas da República. Foi no período republicano que se intensificou a repressão ao entrudo, tendo sido especialmente na década de 1890 abundantes as proibições legais e as ações policiais. Tal campanha negativa encontrava eco na imprensa carioca, médicos, higienistas, cientistas, urbanistas que passaram a se preocupar com a ordenação urbana, numa tentativa de conferir a cidade do Rio de Janeiro uma aura civilizada e eliminar “os hábitos grosseiros e vulgares”, frutos da herança lusa, negra e indígena, símbolos do atraso e do arcaísmo.


REFERÊNCIAS

Monteiro, Débora Paiva. O mais querido "fora da lei": um estudo sobre o entrudo na cidade do Rio de Janeiro (1889-1910) XIV Encontro Regional da ANPUH Memória e Patrimônio. Rio de Janeiro. 2010


Araujo, Patricia Vargas Lopes de. Os festejos de entrudo no século XIX. Textos Escolhidos de Cultura e Artes Populares, v.8. n.2, nov. 2011


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