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LARANJEIRAS - O BAIRRO GLAMOUROSO SEM LARANJAS



A região da Carioca foi dividida em sesmarias, distribuídas entre aqueles que haviam lutado para a expulsão dos franceses e que dispunham de recursos humanos e materiais para desenvolver suas propriedades. Coube à família "paulista" do rico e importante Cristóvão Monteiro, com seus três filhos e o genro José Adorno (dono do maior engenho de São Vicente), a maior sesmaria. Nela construíram casa com torre e moinho. Juntamente com outros sesmeiros, esses primeiros moradores da Carioca iniciaram a transformação da área, derrubando matas, abrindo roças e desenvolvendo a indústria cerâmica principalmente na área do Catete, rica em tabatinga; cortaram morros, drenaram as áreas encharcadas e abriram caminhos. O poder público realizou sua primeira obra na região construindo uma ponte sobre o rio Carioca, permitindo com isso a ligação, via terrestre, entre a "Cidade Velha" e a "Nova". Essa estrada, considerada "Real", resultou nas atuais ruas do Catete e Senador Vergueiro (antigo Caminho Velho de Botafogo).

Realizada a ocupação da Carioca pelos primeiros sesmeiros, os seus sucessores, ao longo do século XVII, transformaram suas chácaras em produtoras de hortaliças, legumes, frutas, cereais (principalmente arroz) e farinha de mandioca, que eram levadas de canoa até o Mercado do Peixe, na Praça Quinze, principal ponto comercial de produtos de subsistência dos cariocas, até o início do século XX.

Uns preferiram explorar a indústria cerâmica, outros a extração de pedras. Os monges de São Bento foram os primeiros a abrir uma pedreira, no atual Morro da Viúva, e foi de lá que retiraram pedras para a construção do seu convento. Da pedreira situada no final da atual rua Pedro Américo saiu o material destinado à construção da Igreja da Glória (por isso, a rua antes chamou-se de "Pedreira da Glória") e da pedreira da rua Bento Lisboa saiu a pedra para a Igreja da Candelária (a rua tinha antes este nome).

Além da exploração agrícola e industrial, os proprietários da Carioca abasteciam a cidade com lenha e carvão produzidos pela derrubada de suas matas. Também vendiam a água do rio Carioca aos moradores do centro da cidade. Esse rendoso comércio dos "aguadeiros da Carioca" só veio a diminuir com a construção do aqueduto que levou as águas do Carioca diretamente para o centro da cidade, em 1736. Os ricos proprietários da Carioca, que em sua maioria dedicavam-se ao comércio ou eram militares graduados, aformosearam suas chácaras com belas casas senhoriais (havia duas com capelas em separado), com a frente da propriedade murada, destacando-se-lhe vistosos portões. Com isso, a região da Carioca foi gradativamente adquirindo um ar de arrabalde urbano "grã-fino". Os proprietários que tinham casa de moradia no centro da cidade, embora continuassem explorando comercialmente suas chácaras, deram-lhes outra conotação, usando-as como espaço de lazer de suas famílias. Eram pessoas importantes, como o comerciante Cosme Velho Pereira (que mais tarde veio a dar nome ao atual bairro do Cosme Velho), ou André Nogueira Machado, que também deu nome ao Largo que ficava em frente à sua propriedade. No século XVIII a Carioca já começa a ser identificada em três zonas distintas: a da Glória, a do Catete (que ia até o Morro da Viúva) e o interior do Vale nomeado Laranjeiras (abrangendo desde o Largo do Machado, inclusive, até a caixa d'água do rio Carioca, na rua Almirante Alexandrino). O nome "Laranjeiras" aparece nos documentos desse século, e o mais antigo que encontramos data de 1780. Maria Graham, inglesa que esteve no Rio de Janeiro em 1821, foi quem criou a versão de que o nome "Laranjeiras" decorria do fato de existirem no local extensos laranjais. É uma versão muito repetida pelos historiadores, mas que não tem fundamento, principalmente porque, no ano em que ela aqui esteve, havia na região, muito mais pé de café do que laranjeiras. Além disso, o nome "Laranjeiras" foi usado desde o século XVI para apelidar até mesmo uma praia sem nenhum pé de laranja, perto de Parati. Em Lisboa há um bairro chamado Laranjeiras devido a uma antiga quinta com este nome. Isso muito antes de nosso bairro se denominar Laranjeiras. Como o bairro lisboeta também era, em sua origem, região de chácaras próximas do centro da cidade, pensamos que pode existir aí alguma relação com o batismo do nosso. As regiões da Glória e do Catete foram as primeiras a se adensarem urbanisticamente em decorrência da subdivisão das antigas chácaras, às vezes em lotes de pequenas larguras de frente, neles sendo construídas casas modestas, acessíveis a uma população menos abastada. Iniciava-se a mudança de enfoque pelo proprietário da terra, passando do uso agrícola para a construção de edificações. O mesmo não ocorreu simultaneamente com as chácaras de Laranjeiras, que mantiveram suas dimensões primitivas. Embora muitas casas tenham sido construídas nessas chácaras, os proprietários as tinham para aluguel, sem delas desvincular o terreno. Em contrapartida ao desenvolvimento da região, ocorreu a poluição do rio Carioca ao longo do trecho abaixo da "Caixa d'Água da Carioca", do alto do Cosme Velho até a Praia do Flamengo. O rio, além de tornar-se depósito de imundices, transformou-se em uma imensa lavanderia. Com o desmatamento das margens do rio e das encostas dos morros, começaram os desabamentos das bordas do Carioca, chegando a tornar intransitável em muitos trechos a Estrada das Laranjeiras. Tornou-se contrastante o aspecto agradável das bem-cuidadas propriedades particulares e a esburacada Estrada das Laranjeiras e o poluído rio Carioca. Apesar desse contraste, o bairro ainda era considerado um dos mais belos arrabaldes da cidade. No final do século XVIII, o território das Laranjeiras (que abrangia o bairro do Cosme Velho) encontrava-se dividido em 17 chácaras, cujos proprietários eram pessoas importantes da sociedade carioca. Entre eles, o tenente-coronel Manuel Ribeiro Guimarães, o comerciante e capitão Antônio José da Silva, o cônego José de Souza Azevedo Pizarro, o capitão José Antônio da Fonseca Lima, João Pinto Gonçalves, o padre José Pires dos Santos (no alto do Cosme Velho) todos com chácaras do lado esquerdo do rio. Do lado oposto, a primeira propriedade (no atual Largo do Machado) era dos herdeiros do comerciante Caetano da Costa Coelho; em seguida, Joaquim José Xavier da Silva (este tinha também a chácara do outro lado e em frente), capitão Antônio Pereira de Lima Velasco, André Simões de Lima, José da Silveira Gulart, Manoel da Cunha Neves (chácara que foi de Cosme Velho Pereira) e, por fim, João da Costa Freitas.

Com a transferência do governo português para o Brasil e o estabelecimento da Corte no Rio de Janeiro, a região da Carioca foi beneficiada em decorrência de alguns nobres terem-na escolhido para residirem. A própria rainha Carlota Joaquina, em 1818, adquiriu uma chácara no Largo do Machado (parte da que pertencera ao tenente Antônio José da Silva). Imediatamente foram realizadas obras na chácara, sob a orientação do Arquiteto Real Manoel da Costa, para adapta-la ao gosto de uma nobre européia. A capela foi restaurada e construído um mirante junto à casa principal, para que a rainha apreciasse a bela paisagem da baía da Guanabara. Por três anos, a rainha utilizou sua chácara de recreio das Laranjeiras. Mas, para saldar suas dívidas, os bens da rainha foram leiloados, entre eles essa chácara, que foi dividida em lotes. Os novos donos construíram suas casas, ganhando o Largo do Machado um aspecto de zona urbana.

O rápido aumento das construções nos terrenos da antiga chácara da rainha, a demanda da população da cidade por terrenos para edificações e por casas para aluguel, além das qualidades ambientais da região da Carioca, indicavam essa área como ideal para a expansão da cidade. Por isso, o comerciante Domingos Carvalho de Sá adquiriu a chácara que pertencera a Joaquim J. X. da Silva e, em 1837, abriu em parte dela a segunda rua do bairro (até então só existia a rua das Laranjeiras). Essa rua, que tinha o seu nome, hoje chama-se Gago Coutinho. A venda dos lotes foi um sucesso. Três anos após, o filho do capitão Antônio Velasco abriu uma rua na propriedade que herdara e vendeu vários lotes, nascendo assim a terceira rua de Laranjeiras - a atual rua Pereira da Silva.

Com o falecimento dos velhos proprietários, seus herdeiros foram loteando cada quinhão da herança e, ao findar o século XIX, já estavam abertas, além daquelas três primeiras ruas, mais 23 logradouros: Ipiranga, Pinheiro Machado, Álvaro Chaves, Soares Cabral, Ribeiro de Almeida, Leite Leal, Sebastião de Lacerda, Alice, Mário Portela, Cardoso Junior, General Glicério (apenas a parte inicial), Eugênio Hussak, São Salvador, praça São Salvador, Conde de Baependi, Senador Corrêa, Esteves Júnior, Paissandu, Coelho Neto, Marquesa de Santos, Moura Brasil, Paulo César de Andrade e Martins Ribeiro.

No aristocrático e pitoresco bairro das Laranjeiras conviviam os belos palacetes ajardinados, o comércio e a indústria. No início, o comércio se restringia ao Largo do Machado e ao começo das ruas das Laranjeiras; em seguida, foi adentrando por essa rua principal, concentrando-se basicamente no trecho do lado par, onde atualmente encontra-se a Hebraica, até perto da rua Almirante Salgado. A indústria se iniciou no bairro com uma fábrica de fogos de artifício na altura da rua Soares Cabral - por isso ela se chamava "beco do fogueteiro". Esse industrial, Antônio José Martins de Moura, que era português e especializado nesse ramo de atividade, requereu licença para instalar sua fábrica em fevereiro de 1854. Os moradores da vizinhança solicitaram, no ano de 1860, o fechamento da fábrica, cujo proprietário era então José Moreira da Cunha Rego; a Câmara Municipal acatou o pedido dos moradores e fechou-a no ano seguinte.

Na área da atual rua General Glicério e adjacências, em 1872, os Srs. Francisco de Sá Nogueira, José Duarte da Fonseca Silva e Miguel Couto dos Santos, sócios na "Companhia Econômica de Lavanderia a Vapor", instalaram uma lavanderia de grande porte. Mas, oito anos depois, a firma mudou de mãos e de ramo, passando a ser uma indústria de "fiação, tecidos e tinturaria" chamada "Alliança". Seus proprietários eram os portugueses José Augusto Laranja (coincidência!), Joaquim Carvalho de Oliveira e Silva e o inglês Henrique Whittaker. Este último, dois anos depois, retirou-se da firma. Assim começou a famosa Fábrica Aliança, que veio a ser uma das mais importantes do ramo no Rio de Janeiro. Essa fábrica mudou a composição sociocultural da população do bairro e, conseqüentemente, sua arquitetura e seu urbanismo. Muitas casas, pequenas, de porta-e-janela, foram edificadas; as vilas se espalharam pelo bairro, além daquelas construídas pela própria fábrica. O comércio cresceu e se diversificou. Os operários - portugueses, italianos e brasileiros - construíram um viver mais coletivo e popular. A fábrica oferecia atividades culturais e de lazer através do clube, do cinema e do teatro, além de escolas para os filhos de seus empregados. O aristocrático bairro de Laranjeiras passou a ser também operário, sem que, segundo depoimento de antigos trabalhadores e pessoas da elite do bairro, hoje ainda vivos, existissem conflitos entre as diversas classes sociais que aqui viviam. A fábrica, por causa de sua localização, não perturbava a filosofia residencial de Laranjeiras.



Havia também outra fábrica, na rua Pereira da Silva, que produzia cerveja, e cujo dono era o Sr. Luiz Bayer. A abundância de água pura encontrável em suas diversas fontes foi o motivo para que essas fábricas se instalassem no bairro.

O Rio de Janeiro passou por grandes transformações urbanas, no final do século XIX e início do atual, para que segundo os governantes, intelectuais e empresários, se adequassem aos tempos modernos. O sonho de todos esses agentes era sanear a cidade, equipa-la, embeleza-la segundo a estética soprada dos centros cosmopolitas da Europa. O prefeito Pereira Passos, o que mais contribuiu para essa cosmopolitização da cidade, era morador de Laranjeiras e fez no bairro grandes obras, como a canalização do rio Carioca em galerias subterrâneas, a urbanização da praça São Salvador, a arborização dos logradouros e a pavimentação a asfalto de várias ruas. Com essas obras, o ar bucólico da rua das Laranjeiras - com o rio correndo, embora canalizado, mas a céu aberto, interceptado por pitorescas pontes - foi eliminado, restando apenas a beleza individual das casas particulares circundadas por seus jardins. Isto até que se iniciasse a derrubada dessas casas para construção dos edifícios de vários andares, símbolo da cidade moderna.

Embora situada entre o centro da cidade e a zona sul, mas por causa das montanhas que cercam a sua área, Laranjeiras era protegida do tráfego de passagem que se fazia entre as duas partes. Essa peculiaridade, que lhe garantia ter apenas o pequeno tráfego interno, começou a ser alterada com a abertura do primeiro túnel da cidade, em 1887, no alto da rua Alice; em seguida, com a realização do corte do Morro Novo Mundo ( Túnel Santa Bárbara) ligando a rua Pinheiro Machado à rua Farani..





Bairro tipicamente residencial, de classe média alta e classe alta, relativamente extenso e diverso no ponto de vista geográfico, tem a Rua das Laranjeiras como a sua principal via, a qual começa no Largo do Machado e termina nas imediações do Túnel Rebouças, já com outro nome: Rua Cosme Velho. Estão situados em Laranjeiras o Palácio Guanabara, sede do Governo do Estado do Rio de Janeiro, o Palácio Laranjeiras, residência oficial do Governador do Estado do Rio de Janeiro, o Parque Guinle, o Fluminense Football Club, é sede do Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, o BOPE, e a Sede Administrativa na cidade da Força Nacional de Segurança e o centro de referência nacional na área de surdez, o Instituto Nacional de Educação de Surdos (Instituto Benjamin Constant)


Parque Guinle

Palácio Laranjeiras


Sede do Fluminense

Palácio Guanabara


Ines


Laranjeiras ainda guarda o charme dos bairros marcados pelo passado e foi o endereço de nobres, escritores, compositores e pessoas ilustres, como Villa-Lobos, Cecília Meirelles, Portinari, Oscar Niemeyer e Roberto Marinho. Ao contrário do que imaginam pessoas que não conhecem o local, não há abundância de laranjeiras no bairro. As árvores mais comuns na vizinhança são as mangueiras.

Durante a gestão do prefeito Mendes de Moraes (1947-1951) foi feito o projeto de construção do Túnel Santa Bárbara (Catumbi-Laranjeiras), só concluído em 1963. Dois anos depois seria inaugurado o Túnel Rebouças, facilitando o trânsito entre o bairro e a Lagoa Rodrigo de Freitas.


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